domingo, 13 de março de 2011

Sobre o discurso de Cavaco: duas citações e duas memórias!


"É necessário que um sobressalto cívico faça despertar os Portugueses para a necessidade de uma sociedade civil forte, dinâmica e, sobretudo, mais autónoma perante os poderes públicos"





"O exercício de funções públicas deve ser prestigiado pelos melhores, o que exige que as nomeações para os cargos dirigentes da Administração sejam pautadas exclusivamente por critérios de mérito e não pela  filiação partidária dos nomeados ou pelas suas simpatias políticas"

Portugal em default mode, e em estado de limbo!

Adoro ouvir comentadores a dizer default. Um conceito delicioso acerca de um país. Porque se com uma empresa o senhor do fraque por ali adentro entra, arresta as máquinas e o fisco fica com as porcelanas será interessante perguntar-nos:  e com um país como é? A Grécia entrou em default, a senhora Merkel manda ir buscar a acrópele para o centro de Berlim? Na Irlanda levam as reservas de uísque? E em Portugal colocam uma fitinha em torno dos Jerónimos com  uma bandeirinha alemã a flutuar na ponta? O conceito de default acerca de um país é assim no mínimo exótico. E se não nos põem, de facto, as malas à porta ou nos arrestam os bens numa qualquer carrinha de caixa aberta de matrícula alemã, o carimbo de “não confiável”, levar-nos-á anos a voltar aos mercados, sem qualquer capacidade de financiamento externo. A Grécia tem um juro que esta semana chegou aos 13%, a Irlanda nunca conseguiu baixar o nível de juros para os que tinha antes do resgate. Tudo totalmente incompatível com qualquer Estado Social, com qualquer estilo de vida de Europa Ocidental ou de qualquer União Monetária!
Na história desta crise estas últimas duas semanas foram negras: juros em quase 8%, Merkel a puxar as orelhas a Sócrates, novo PEC, Cavaco acordado ao fim de 5 anos.
Estamos no mais absoluto limbo: não aguentamos muito mais meses este nível de juros, a Europa paralisou e qualquer ajuda a Portugal nunca será uma versão soft daquela que já foi dada à Irlanda ou à Grécia, ou seja podemos esperar um juro absurdo na casa dos 5%.
Estamos em default mode e completamente escalhados no nada. Não pedimos a pouco misericordiosa Ajuda Europeia, mas também não nos aguentamos no ponto em que estamos. Entre a espada e a parede Sócrates não sai, Passos não faz cair e Cavaco mudou de humor de repente.
No GPS não há nenhuma coordenada de futuro!

O ciclo de uma geração

Quando há quase um ano aqui escrevi pela última vez, Portugal estava no PEC I (que naifs que então ainda éramos!), entretanto vamos no PEC IV e a solução é nenhuma. E é nenhuma porque Portugal entrou exactamente na mesma espiral em que está a Grécia e a Irlanda. Os pacotes de austeridade entraram num ponto de não retorno. O nível fiscal é praticamente impossível elevar a um nível superior, arriscando-nos a entrar no paradoxo económico de entrar num ciclo de fuga fiscal que fará inevitavelmente diminuir as receitas. Resta o lado da despesa! E aqui com os abocanhamentos recentes ao grande bolo da pensões  e dos salários. E assim prepara-mo-nos para o nosso 2º possível default, não o da dívida externa, mas o do contrato social interno, um epitáfio para o qual ninguém se preparou e que agora vemos cair-nos no colo.
Teixeira dos Santos anunciou ontem que iria congelar todas as pensões em 2012 e 2013. A pensão media em Portugal em 2009 era de 333€, o nível de inflação era já em Janeiro deste ano de 3.6%. A esta combinação impraticável  foram anunciados simultaneamente reduções de comparticipações em medicamentos e ainda uma liberalização das rendas, o que sobre rendas antigas de casas de muitos idosos poderá ter um efeito hiper inflacionário. É uma estocada mortal no país, numa franja velha e idosa, que até agora uma carcaça seca comia e que se vê agora apenas com as migalhas dessa mesma carcaça.
Há uma geração que nasceu com o Salazarismo, acreditou no contrato social de Abril, são com estes que Portugal e o Estado entrou em default social. Sócrates deu um murro terrível na velhice, naqueles que ao contrário dos mercados não podem pedir mais juros, não podem fazer pressão, não podem baixar ratings.
O PEC de ontem é uma monstruosidade humana para uma parte da sociedade que não se ouviu piar, porque a sua voz não alcança. Não alcança Merkel e Barroso que se rejubilaram com as novas medidas.
Estes velhos não se revoltarão, nasceram sem se poder revoltar e mal vivendo… e voltaram ao mesmo ponto!