sábado, 5 de julho de 2008

O Espartilho


As senhoras do século XIX espremiam as suas pobres caixas torácicas em espartilhos que elas sonhavam sempre que lhes poderiam tirar mais aquela ponta de gordura, acabando presas na rigidez do seu próprio corpo. Pobres senhoras que apertadinhas viveram durante tantas décadas, e pobres de nós que vivendo dois séculos depois, espartilhados vivemos à espera de uma qualquer mudança que nos dê de novo ar para respirar.
Em 200 anos as mulheres largaram os espartilhos e partiram para o soutien, há duzentos anos Portugal era pobre e pobre ficou e pobre está, e hoje como no passado não largámos mais o nosso espartilho, que voltou a apertar quando o Banco Central Europeu decidiu aumentar as taxas de juro de novo há dois dias. Chegámos ao triste momento em que ou travamos a inflação galopante ou mantemos as taxas de juro e assim tentamos gerar alguns empregos e um tanto crescimento económico. Os dois? Um sonho, essa quimera que não poderemos ter, ainda para mais quando vivemos uma crise de mercados enlouquecidos.
O aumento da taxa de juro de há dois dias e o outro aumento que se espera até ao final do ano fazem engolir as ajudas de Sócrates, afogando para um buraco negro os bem endividados bolsos Portugueses.
Mas regressando ao Portugal de há 200 anos, o tal em que as senhoras usavam espartilho, aquele era o Portugal dependente da vontade dos Impérios que faziam soprar os ventos que corriam no velho continente. Passados duzentos anos continuamos, e como Medina Carreira referiu há dois dias na SIC Notícias, como um barco à deriva levado pelas marés Europeias. A Europa cresce? Crescemos também. A Europa entra em recessão? Entramos nós também, tão dependentes, tão vulneráveis que continuamos, incapazes de alguma mudança estrutural produzir, incapazes de mudar o valor médio de 800€ de salário médio mensal que nos eleva a país com ordenados mais baixos da OCDE.
Em Portugal o espartilho nunca passou de moda, teve e continua a ter sempre uma nova versão. E lá vamos nós no aperta aperta a desafiar a nossa resistência até ao dia em que o pobre do espartilho já não tiver mais por onde apertar.

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